Marte se moveria segundo uma curva mais simples se imaginássemos
a Terra em repouso, ou se imaginássemos que ela está
em movimento como acreditava Copérnico? Kepler adotou a idéia
comperniciana de que a Terra gira em redor de seu eixo, ao mesmo tempo
que percorre uma órbita em tôrno do Sol. Seguindo a tradição,
êle tentou primeiro um sistema de círculos que se moviam
sôbre outros círculos para obter órbitas possíveis.
Fez inúmeras tentativas cada uma envolvendo longos e laboriosos
cálculos. Tinha de traduzir as medidas de Tycho, do ângulo
entre Marte e as estrêlas fixas, para definir a posição
do planêta no espaço em relação a um Sol
fixo, em tôrno do qual se movia a própria Terra.
Depois de cêrca de setenta tentativas, usando órbitas
do tipo "círculo excêntrico", Kepler encontrou
um esquema que concordava muito bem com os fatos. Depois, para seu
desânimo, verificou que essa curva, quando prolongada além
do domínio dos dados que havia usado, discordava de outras
observações da posição de Marte, feitas
por Tycho.
A discordância entre os dados de Brahe e os cálculos
de Kepler eram de cêrca de 8/60 de grau (êste é
o ângulo percorrido pelo ponteiro menor de um relógio
em 0,02 segundo). Não poderia Tycho ter cometido êsse
pequeno êrro? Não poderia o frio de uma noite de inverno
ter entorpecido seus dedos, ou confundido suas observações?
Kepler conhecia os métodos de Tycho e seu cuidado escrupuloso.
Tycho nunca teria cometido nem êsse pequeno êrro. Assim,
baseado nos dados de Tycho, Kepler rejeitou as curvas que tinha construido.
Que tributo era isto à memória de seu mestre!
Dizendo que "Sôbre êsses oito minutos poderia ainda
construir uma teoria do Universo", Kepler recomeçou. Desprezando
a antiga e estimada crença no movimento uniforme, considerou
possíveis variações na velocidade de um planêta
quando êste se move em tôrno do Sol. Fez então
sua primeira grande descoberta. Verificou que uma linha tirada do
Sol ao planêta descreve áreas iguais em tempos iguais.
Isto veio a ser conhecido como a segunda lei de Kepler (Fig.22-9).
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22 - 9 - Lei de Kepler das áreas iguais.
Marte percorre sua órbita com velocidade variável
movendo-se mais rapidamente quando está mais próximo
do Sol. Kepler verificou que, para intervalos de tempo iguais,
t2 - t1 = t4 - t3,
as áreas varridas pela linha que vai do Sol ao planeta
eram iguais. (Área B = Área A). No desenho o alongamento
da elipse foi exagerado para ilustrar mais claramente a lei das
áreas iguais. |
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Após a descoberta de sua segunda lei, Kepler
abandonou finalmente suas tentativas de construir os movimentos planetários
a partir de combinações de movimentos circulares uniformes
e começou a tentar várias ovais como órbitas
possíveis. Depois de muitos cálculos mais complicados,
conseguiu finalmente um de seus resultados mais importantes: a assim
chamada primeira lei. Verificou que cada planêta move-se numa
órbita elítica, estando o Sol num dos focos. Imagine-se
o deleite de Kepler. Após tantos anos de esfôrço,
tinha finalmente encontrado uma curva simples que descrevia o movimento
dos planêtas.
Kepler pôs-se, então, a procurar uma conexão entre
o tamanho da órbita de um planêta e seu período,
isto é, o tempo de uma revolução do planêta
em tôrno do Sol. Após muitas tentativas, obtêve
a relação precisa que procurava: para todos os planêtas,
a razão entre o cubo do raio da órbita e o quadrado
do período é a mesma (*). Uma vez calculada esta razão,
a regularidade era flagrante (Ver Tabela 1). A constância da
razão R3/T2 é chamada a terceira
lei de Kepler.
Com êste triunfo, Kepler escreveu: "...o que dezesseis
anos atrás eu exigia, com uma coisa a ser procurada...o motivo
pelo qual procurei Tycho Brahe...por fim eu trouxe à luz e
reconheço sua verdade além de minhas esperanças
mais apaixonadas... A sorte está lançada, o livro está
escrito para ser lido agora ou pela posteridade. Não me preocupo
- êle bem pode esperar por um leitor durante um século,
como Deus esperou seis mil anos por um observador".
(*) O raio R de uma órbita é definido como a média
aritmética entre a maior e a menor distância do Sol ao
planêta. Como as órbitas planetárias não
são muito diferentes de círculos, a distância
do Sol a qualquer ponto da órbita bastará para a maioria
dos fins.
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